O uso e o abuso do álcool pelos adolescentes

O consumo de bebidas alcoólicas no Brasil somente é permitido após os 18 anos de idade, entretanto existem poucos empecilhos á sua aquisição por adolescentes menores que 18 anos.   A lei federal 8.069, de 13 de julho de 1990, que instituiu o “Eca” prevê no artigo 243, pena de detenção de seis meses a dois anos para quem: “Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a crianças e adolescentes, sem justa causa, produtos cujo os componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indireta”. O artigo 243 foi reeditado pela lei federal 10.764, de 12 de novembro de 2003 aumentando a pena para reclusão e o tempo para 2 a 4 anos mais multa.

Lei do estado de São Paulo nº 14.592, de 19 de outubro de 2011, proíbe vender, ofertar, fornecer, entregar e permitir o consumo de bebida alcoólica, ainda que gratuitamente, aos menores de 18 (dezoito) anos de idade, e dá providências correlatas, fiscalizando e punindo os estabelecimentos que não cumprirem a lei.

Por outro lado as propagandas veiculadas na mídia incentivam os jovens a beberem cada vez mais, nesse sentido existe a lei 9.294, de 2 de julho de 1996 reeditada duas vezes em 2000 e em 2003 que regulamenta a propaganda de bebidas alcoólicas, mas ela considera para tal regulamentação, apenas as bebidas potáveis acima de 13 graus Gay Lussac. Com isto as propagandas de cervejas ficam fora desta regulamentação. A cerveja é a bebida alcoólica mais consumida por crianças, adolescentes e adultos no Brasil.

Outro fator de extrema relevância é a influência que a permissividade e as atitudes dos pais têm sobre a opção dos filhos quanto ao uso abusivo de álcool e mesmo de drogas e cigarros.  Demonstram que na maioria das vezes os adolescentes começam a ingerir bebidas alcoólicas em casa e muitas vezes, estimulados pelos pais. Alguns pais utilizam o seguinte argumento: prefiro que bebam em casa sob minha supervisão, ou até permitem bebidas nas festas em sua casa para que o filho ou filha se tornem mais populares entre os colegas. Outro ponto a se considerar na família é o uso que ela faz do álcool, seja como sempre associá-lo a situações de alegria ou recompensa, ou mesmo o uso abusivo por algum dos pais. Os problemas familiares que não relacionados ao álcool também influenciam o abuso do álcool entre os adolescentes. Um estudo da Unifesp realizado em escolas paulistanas, em mais de 40% dos casos, a primeira experiência com álcool ocorreu na própria casa do jovem, com um drinque oferecido por alguém da família. Irmãos que fazem uso de álcool ou outras drogas também influenciam negativamente o adolescente.

Fatores genéticos, como em adultos tem peso maior que o ambiental. Em relação mídia, estudo realizado nos Estados Unidos mostrou mais influencia da mídia sobre as mulheres.

Mas porque beber na adolescência é tão prejudicial que são necessárias leis estipulando idade mínima?

O uso de álcool por adolescentes está fortemente associado à morte violenta, queda no desempenho escolar, dificuldades de aprendizagem e prejuízo na elaboração e estruturação das habilidades cognitivas e comportamentais. O cérebro adolescente é projetado para adquirir informações, adaptar e aprender, ou seja, está em processo de maturação.

Esta plasticidade que facilita neuromaturação, também o torna particularmente vulnerável aos efeitos nocivos do álcool.

Por que alguns adolescentes bebem?

Transições de desenvolvimento tais como  a puberdade e a crescente independência, têm sido associadas com a utilização de álcool. Então, em certo sentido, sendo apenas um adolescente pode ser um fator de risco não só para começar a beber, mas também para beber perigosamente. O cérebro continua a se desenvolver até bem mais de 20 anos, tempo durante o qual continua a estabelecer conexões de comunicação importantes e refina ainda mais a sua função. Acredita-se que esse longo período de desenvolvimento pode ajudar a explicar parte do comportamento que é característico da adolescência, tais como sua propensão a buscar situações novas e potencialmente perigosas. Para alguns adolescentes, busca por emoção pode incluir experiências com álcool.

Sensibilidade e tolerância ao álcool são diferentes entre o cérebro adulto e o cérebro do adolescente, isto pode ajudar a explicar por que muitos bebedores jovens são capazes de consumir quantidades muito maiores de álcool do que o adulto antes de sentir as consequências negativas do consumo de álcool, como sonolência, falta de coordenação e ressaca.

Filhos de alcoolistas são entre 4 e 10 vezes mais propensos a se tornarem alcoolista do que quem não tem parentes próximos alcoolista. São mais propensos a começar a beber em uma idade jovem e progredir para problemas com a bebida mais rapidamente.

Como bebe o adolescente?

Pode se dizer que o adolescente “bebe em binge”.

Beber consumindo um volume excessivo de álcool num curto espaço de tempo é uma prática conhecida na literatura internacional como “binge drinking”, ou “beber em binge”. O termo é empregado no mundo todo para definir o “uso pesado e episódico do álcool”. Esse é um tipo de beber mais perigoso e frequentemente associado  a  uma  série  de  problemas, físicos,  sociais  e mentais. Isso se dá pelo fato de ocorrerem, durante o episódio desse tipo de beber, importantes modificações neurofisiológicas (desinibição comportamental e comprometimento cognitivo,  diminuição  da  atenção,  piora  da  capacidade  de  julgamento, diminuição da coordenação motora, etc.).

A quantidade que define o “beber em binge” foi estabelecida por inúmeros estudos, em 5 doses para homens e 4 doses para mulheres, em uma só ocasião. Beber essas quantidades,  ou acima delas, pode levar a intoxicações frequentemente associadas a uma grande série de problemas. Os efeitos do “beber em binge” podem ser agravados de acordo com o peso da pessoa, a idade, a rapidez com que consome, o fato de ter-se alimentado ou não e, naturalmente, o número de doses  que  consumiu.  Fatores  sociais  e  psíquicos  podem  contribuir  para  esse agravamento, como problemas escolares, a falta de perspectiva – especialmente entre os mais jovens – e conflitos  familiares  e  de  relacionamento.  Em  quase  todos  os  países  onde  esse  fenômeno  foi estudado, o “beber em binge”, mesmo que esporádico, causa maiores custos sociais e de saúde do que o uso contínuo e dependente.

Dois tipos de problema, acidentes e violência, merecem destaque em relação ao “binge”:

Dentre os acidentes os mais comuns são: de carro, quedas, atropelamentos, afogamentos. Vários tipos de violência estão relacionados ao “binge”, como homicídios, roubo, violência doméstica, agressões físicas, violência sexual, etc.

Os efeitos do álcool e outras drogas sobre o cérebro adolescente

Este efeito provavelmente é múltiplo, porque a imaturidade e a plasticidade do cérebro em desenvolvimento confere grande vulnerabilidade. O uso do álcool na adolescência precoce, somada a disposição genética aumenta o risco de dependência.

O álcool agindo sobre o córtex pré-frontal pode fazer com que o adolescente queira buscar mais drogas, principalmente para minimizar os efeitos da abstinência.

Ocorre deteriorização da memória a qual continua deteriorando conforme continua o uso.

Beber álcool durante este período de rápido crescimento e  desenvolvimento (isto é, antes ou durante a puberdade) pode perturbar o equilíbrio hormonal crítico necessário para o desenvolvimento normal dos órgãos, músculos e ossos. Alteração das enzimas hepáticas tem sido observada em adolescentes que bebem em binge, e as alterações enzimáticas são piores quanto mais acima do peso ideal o adolescente se encontra.

Álcool e energéticos

A associação de álcool com energéticos tem sido cada vez mais comum entre jovens, inicialmente eram utilizadas em festas em casas noturnas, hoje é pratica comum principalmente associados a destilados.

As bebidas energéticas são ricas em substâncias estimulantes,  cafeína, guaraná, taurina e efedrina. Existe a falsa crença de que esses estimulantes retardariam os efeitos depressores do álcool, sendo possível beber em grandes quantidades e não ficar bêbado. Algumas pessoas inclusive acreditam que as bebidas energéticas permitem dirigir mesmo após ingestão de grandes de bebidas.

Na verdade, a associação de álcool com energéticos realmente leva a percepção de uma menor embriaguez, porém, o fato é que, após testes de habilidades motoras, acuidade visual e reflexos, fica claro que a intoxicação pelo álcool é exatamente igual. Isso é extremamente perigoso, pois assim adolescente tem maior dificuldade em reconhecer que não está apto a conduzir ou efetuar outras tarefas motoras.

A inibição da percepção de embriaguez também faz com que as pessoas acabem ingerindo mais álcool do que conseguiriam se não estivessem tomando concomitantemente tantos estimulantes, facilitando a ocorrência de complicações como o coma alcoólico.

Assim como o álcool, todas essas substâncias estimulantes, quando em excesso, podem causar arritmias cardíacas. Como essa associação é normalmente feita em pessoas jovens e sadias, os risco de complicações são menores, porém, existem vários relatos de convulsões e morte súbita de origem cardíaca  em pessoas que exageram.

A cafeína também é um diurético e o seu abuso em conjunto com o álcool pode levar a desidratação e piorar os sintomas da ressaca no dia seguinte.

Estabelecer idade mínima para o adolescente consumir bebidas alcoólicas pode prevenir o mal uso do álcool.

Comportamentos complexos, como a decisão de começar a beber ou para de usar álcool, são resultado de uma interação dinâmica entre genes e ambiente. Por exemplo, mudanças biológicas e fisiológicas que ocorrem durante a adolescência podem promover a adoção de comportamentos de risco, levando a experimentação precoce do álcool. Este comportamento, em seguida, molda o ambiente do adolescente, como ele ou ela escolhe os amigos e situações em que  possa beber mais. Desta forma, os padrões juvenis de consumo de álcool podem marcar o início de um caminho de desenvolvimento que pode levar ao abuso e à dependência. Entretanto nem todo adolescente que experimenta vai fazer mal uso.

O estabelecimento de uma idade mínima para beber leva em conta a alterações fisiológicas da puberdade, os fatores protetores, a genética, características de personalidade, os fatores sociais e ambientais. Com um período maior para iniciar o uso o adolescente adquiriria maior experiência e os pais poderiam observar melhor o comportamento e atitudes do adolescente e orientar melhor o uso.

Outro ponto importante é que os adolescentes amadurecem em tempos diferentes.

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